Cardeal Tempesta abre Simpósio Internacional de Direito Canônico no Rio

Fonte: ArqRio


O arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Orani João Tempesta, abriu oficialmente nesta segunda-feira, 15 de fevereiro, o II Simpósio Internacional de Direito Canônico, no Centro de Estudos e Formação do Sumaré. 
O encontro, que é realizado pelo Pontifício Instituto Superior de Direito Canônico do Rio de Janeiro, acontece até o dia 18 e tem como tema: “As reformas processuais na Igreja e o Sínodo da Família – O direito ao encontro da misericórdia”.
“Sem perder a santificidade do processo, o Papa pediu mais celeridade aos juristas, tribunais e câmaras eclesiásticas, e que os casos fossem tratados com amor”, declarou o diretor do Pontifício Instituto Superior de Direito Canônico, cônego José Gomes. Segundo ele, o encontro será frutuoso e a discussão enriquecerá, de forma particular, a Arquidiocese do Rio de Janeiro.

Leia na íntegra o texto de abertura proferido pelo Cardeal Orani João Tempesta:

Saudação e boas-vindas na abertura do III Simpósio Internacional de Direito Canônico
Rio de Janeiro, RJ, 15 a 18 de fevereiro de 2016 Centro de Estudos do Sumaré

Desejo saudar, de início, e o faço vivamente, os conferencistas: V. Ema. Revma. Cardeal Francesco Coccopalmerio, Presidente do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos; V. Ema. Revma. Cardeal Odilo Pedro Scherer (que ainda irá chegar), Arcebispo de São Paulo; o S.E.R. o Exarca D. Dimitros Salachas, Exarca Emérito da Igreja Greco-Católica; e o Prof. Dr. Padre Manuel Arroba Conde, CMF, Presidente do Instituto Utriusque Iuris da Pontifícia Universidade Lateranense em Roma. 

Agradeço por terem vindo partilhar e esclarecer os importantes documentos que o Papa Francisco quis escrever para responder a um apelo da Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, de outubro de 2014, sobre a celeridade do processo matrimonial.

Quero saudar e agradecer, de modo especial a Equipe que preparou este Simpósio, na pessoa do Diretor do Pontifício Instituto Superior de Direito Canônico, o Cônego José Gomes de Moraes.

Acolho com alegria todos os Bispos, os Oficiais dos Tribunais Eclesiásticos, Estudiosos do Direito Canônico e canonistas do Brasil e de outros países que são participantes deste Simpósio Internacional de Direito Canônico. Sabemos das dificuldades do deslocamento e também das acomodações aqui neste Centro de Estudos do Sumaré, uma vez que o interesse despertado por este assunto fez com que acorresse para este simpósio um grande número de participantes, que, inclusive, supera a
lotação desta casa de encontros. Pedimos desculpas desde já pelas dificuldades encontradas. Mas queremos que saibam que desejamos acolher a todos com toda a abertura de coração.

Esta cidade se prepara, com os braços abertos do Cristo Redentor, para acolher milhares de pessoas que virão para os Jogos Olímpicos e, comparando com o estádio onde todos correm e também com a tocha olímpica que passa de mão em mão até acender a pira, desejo que este simpósio nos ajude a correr para sermos missionários e promotores da misericórdia infinita de Deus sobre tantos que passam por dificuldades e se sentem excluídos da Igreja, para acendermos a pira da verdade e da luz que deve brilhar nos corações das pessoas. Neste ano do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, o tema deste Simpósio Internacional nos recorda “As  reformas processuais na Igreja e o Sínodo da Família” – “O direito ao encontro da misericórdia”.

Estamos, pois, vivendo um momento de graça. Ano Santo Extraordinário da Misericórdia, proclamado pelo nosso amado Papa Francisco, quando, sem dúvida, somos recordados a viver que:
“Misericórdia: é a lei fundamental que mora no coração de cada pessoa quando vê com olhos sinceros o irmão que encontra no caminho da vida”. “Misericórdia: é o caminho que une Deus e o
homem, porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar da limitação do nosso pecado” (MV,n. 2),

São João Paulo II já nos recordava que o Matrimônio é comunhão de amor. Para o amor: “Deus nos criou por amor, criou-os para o amor”. Mas não um amor isolado, individualista, voltado à própria pessoa. Seria isso egoísmo. Mas para o amor comunicativo, capaz de se abrir aos outros.
Segundo o plano divino, a Família é a primeira e fundamental expressão deste amor. E como a melhor manifestação do amor é a doação, na Família todos se doam reciprocamente; os esposos entre si, os pais aos filhos, os filhos aos pais, os irmãos uns aos outros. Nessa doação de todos é que está
a comunhão de vida e de amor.

A Igreja tem trabalhado sempre esse tema. Ultimamente podemos destacar: V Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, realizada em outubro de 1980, com o tema: “a missão da família cristã no mundo
contemporâneo”; a criação do Pontifício Conselho para a Família, em 09 de maio de 1981, substituindo o comitê para a família, criado por Paulo VI, em 1973; a encíclica “Familiaris Consortio” (1981); a carta dos direitos da família (1983); a carta às famílias (1994); além das centenas de discursos e declarações de São João Paulo II sobre a família. Em 1994, que foi
proclamado o Ano Internacional da Família, se iniciaram os encontros mundiais das famílias: desde então já foram realizados oito encontros mundiais.

Nos dois últimos anos, em continuidade com essa atenção especialíssima que a Igreja tem para com a família, o Papa Francisco convocou a III Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos,
tratando “os desafios pastorais sobre a família no contexto da evangelização”; e a XIV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, abordando “a vocação e a missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo”.

São João Paulo II afirma que “A família, fundada e vivificada pelo amor, uma comunidade de pessoas; dos esposos, dos pais e dos filhos. A sua primeira tarefa é a de viver fielmente a realidade da comunhão num constante empenho por fazer crescer uma autêntica comunidade de pessoas. O princípio interior, a força permanente e a meta última de tal dever é o amor: como sem o amor, a família não é uma comunidade de pessoas, assim, sem o amor, a família não pode viver, crescer e perfeiçoar-se como comunidade de pessoas” (FC, n. 18).

O Sínodo das Famílias, concluído em outubro do ano passado, aprofunda este e outros pontos e tenta trazer respostas às angústias do nosso tempo. A família retrata em si o que acontece no próprio Deus, em que o Pai se dá totalmente ao Filho e em que o Espírito Santo é o amor ou doação substancial de ambos. Para nossa ação pastoral é indispensável conhecermos este mundo a que somos enviados.

São João Paulo II, na Constituição “Sacræ Disciplina leges”, afirmava quanto ao Direito Canônico:

“Torna-se claro, pois, que o objetivo do Código não é, de forma alguma, substituir, na vida da Igreja ou dos fiéis, a fé, a graça, os carismas, nem muito menos a caridade. Pelo contrário, sua
finalidade é, antes, criar na sociedade eclesial uma ordem que, dando primazia ao amor, à graça e aos carismas, facilite ao mesmo tempo seu desenvolvimento orgânico na vida, seja da
sociedade eclesial, seja de cada um de seus membros”.

Os que legitimamente recebem da Igreja a responsabilidade do Direito Canônico são chamados a ser testemunhas infatigáveis de uma justiça superior, num mundo caracterizado pela injustiça e pela violência, pela corrupção e pelo indiferentismo a tantos valores fundamentais à vida humana, tornam-se preciosos colaboradores na atividade pastoral da misericórdia eclesial na missão de evangelizar e santificar.

No contexto humano e cultural no qual nos encontramos é extremante importante deixar bem claro qual é o desígnio de Deus para a família, o que a fé nos ensina a respeito dessa instituição que é fundamental para o desenvolvimento humano. Como colocou o Papa Francisco, no discurso por ocasião da inauguração do Ano Judiciário do Tribunal da Rota Romana, no dia 22 de janeiro deste ano: “não pode haver confusão entre a família querida por Deus e qualquer outro tipo de união”.

Contudo, “a Igreja sabe, afirma o Santo Padre no referido discurso, que entre os cristãos alguns têm uma fé forte, formada pela caridade, fortalecida pela boa catequese e alimentada pela oração e pela vida  sacramental, enquanto outros têm uma fé débil, descuidada, não formada, pouco educada, ou esquecida”.

Sabemos que a Justiça retardada é a Justiça negada. Por isso, em bom momento o Papa Francisco atendeu aos apelos dos padres sinodais e promulgou no Motu Propio “Mitis iudex Dominus Jesus” as razões do mesmo:

“É, portanto, a preocupação pela salvação das almas que continua a ser – hoje como ontem – o fim supremo das instituições, das leis, do direito, que impele o Bispo de Roma a oferecer aos Bispos este documento reformador, enquanto partilham com ele esta tarefa da Igreja, isto é, tutelar a unidade na fé e na disciplina relativamente ao matrimônio, centro e origem da família cristã”.

“O impulso reformador é alimentado pelo ingente número de fiéis que, embora desejando prover à sua própria consciência, muitas vezes foram afastados das estruturas jurídicas da Igreja por causa da distância física ou moral; ora, a caridade e a misericórdia exigem que a própria Igreja, como mãe, se torne próxima dos filhos que se consideram separados”. 
Ainda o Santo Padre: “Em total sintonia com tais desejos, decidi, com este “Motu Proprio”, dar disposições que favoreçam não a nulidade dos matrimônios, mas a celeridade dos processos, no fundo, uma justa simplificação, para que, por causa da demora na definição do juízo, o
coração dos fiéis que aguardam pelo esclarecimento do seu próprio estado não seja longamente oprimido pelas trevas da dúvida”.

“A lei suprema da Igreja, de fato, é a salvação das almas” como lembra o Santo Padre, porém, os dois documentos destinados a ajudar na celeridade dos processos de nulidades matrimonial têm despertado muitas dúvidas sobre como aplicá-los. Claro que, em nosso caso ocidental, mais o
próprio da Igreja latina. Porém, para sermos completos e para ajudar os estudiosos e professores, trouxemos também quem pode nos esclarecer e dirimir dúvidas do documento destinado à Igreja oriental. Por isso, em boa hora abrimos agora este Simpósio com membros da comissão criada na
Santa Sé justamente para discutir esse assunto.

Em janeiro deste ano foi publicado o Subsídio para aplicação do Motu Próprio “Mitis Iudex Dominus Iesus”, elaborado pelo Tribunal Apostólico da Rota Romana, além de outros documentos surgidos neste tempo após a emissão do motu próprio.

O Legislador colocou em prática escutando as necessidades e os apelos dos Bispos quando da Assembleia Extraordinária do Sínodo da  Família: ouviu e acolheu colocando em prática as reformas processuais que é o tema principal deste Simpósio. Desejamos que as possíveis dúvidas
possam ser esclarecidas.

Sua Eminência, o Cardeal Coccopalmerio, e o Reverendíssimo Prof. Padre Manuel Arroba Conde, CMF, nos ajudarão a aprofundar e esclarecer os pontos do Motu Proprio Mitis Iudex Dominus Iesus, trazendo também os aspectos da Reforma do Direito Penal Eclesiástico.

Já Sua Excelência Reverendíssima, o Exarca Emérito D. Salachas, nos trará os esclarecimentos sobre o Motu Proprio “Mitis et misericors Iesus”.

Com alegria, agradeço aos que trabalharam na elaboração deste simpósio, aos patrocinadores, e a todos os colaboradores, acolhendo-os afetuosamente; que tenham dias abençoados, esclarecedores e felizes entre nós, com pleno sucesso deste III Simpósio Internacional que iniciamos sob
o olhar benfazejo de Deus, supremo e misericordioso juiz.

Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

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